A Bacia Sedimentar do Pantanal (BSP) é uma das regiões mais sísmicas do território brasileiro. Cientes disso, a Universidade de São Paulo e a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul monitoram a região por meio da implantação de estações sismográficas no local. “Essa parceria é muito antiga, começou em 2003. A Bacia, dentro do tempo geológico, é muito recente (período quaternário). Assim para os estudos sismológicos e geológicos, além dos estudos do próprio levantamento sísmico da bacia, entender como se forma uma bacia sedimentar e conhecer mais sobre as suas áreas profundas como a crosta, o manto, chegando até o núcleo, são importantes para a compreensão da origem e evolução da BSP”, explica a professora Edna Maria Facincani.
Edna é professora da Faculdade de Engenharias, Arquitetura e Urbanismo e Geografia (Faeng) e coordena o Laboratório de Sismologia da UFMS. “Um dos objetivos dos projetos é formar mão-de-obra especializada na área de geofísica. Para isso é fundamental que tenhamos laboratórios equipados com programas para aplicação dessas informações ligadas à geofísica”, destaca. Segundo a professora, a Universidade, por meio da Faeng, do Instituto de Física e do Câmpus de Aquidauana (CPAQ), participa dos projetos da Rede Sismográfica Integrada do Brasil (Brasis), Bacias do Pantanal-Chaco-Paraná: estrutura e evolução sísmica da crosta e do manto superior e Mapeamento de Perigo Sísmico da Bacia Sedimentar do Pantanal (BSP). Os projetos são desenvolvidos pelo Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP.
Para o especialista do Centro de Sismologia da USP Jackson Calhau a parceria foi fundamental. “Tudo começou em 2003 com a instalação temporária de uma estação sismográfica em Aquidauana. A parceria foi estabelecida em definitivo em 2010 com a instalação permanente da estação AQDB (Aquidauana), integrante da Rede Sismográfica Brasileira (RSBR). A UFMS, por meio da professora Edna, atuou ativamente para conseguirmos as permissões e apoio logístico local. Hoje, a RSBR conta com mais de 90 estações espalhadas por todo o Brasil”, conta.
Ele detalha que a RSBR tem por objetivo monitorar a sismicidade do território nacional e gerar informações que suportem a investigação da estrutura interna da terra. “Atualmente o Centro de Sismologia da USP conta com um sistema de detecção automática de terremotos, SeisComp, utilizado para determinação do epicentro e magnitude aproximada dos tremores. Após a determinação automática, nossos analistas revisam os registros e essas informações são divulgadas no portal do Centro de Sismologia e no portal da Rede Sismográfica Brasileira”, comenta.
“Nem sempre o sistema consegue localizar um tremor automaticamente, normalmente por causa do espaçamento entre as estações e/ou baixa magnitude do sismo. Nesses casos uma outra ferramenta do Centro nos auxilia a preencher essas lacunas no monitoramento sismológico do país, trata-se do Sentiu aí”. A população deixa seu relato através do nosso portal ou aplicativo, nosso time checa os registros das estações próximas, confirmando ou não se ocorreu um tremor de terra. Essa troca de informação tem sido importantíssima para gerarmos um catálogo sísmico brasileiro cada vez mais completo”, destaca Jackson
Na UFMS, segundo Edna, estão envolvidos no projeto e nas atividades realizadas no Laboratório, professores e estudantes de cursos como Física, Matemática, Engenharia Civil e Geografia. “No projeto atendemos tanto acadêmicos de iniciação científica, na graduação, bem como estudantes de pós-graduação, como por exemplo, do programa de pós-graduação do CPAQ”, relata a professora.
“Já temos uma grande quantidade de dados coletados na Bacia. Uma parte está aqui no Laboratório de Sismologia da UFMS e outra parte no Centro de Sismologia da USP. O projeto está em processo de expansão. Estamos, hoje, com cerca de 30 estações instaladas na Bacia do Pantanal e adjacências. Com certeza isso ainda vai trazer muitos dados importantes para a Geofísica. Principalmente, dessa última etapa que começou em 2022 com a instalação de um Transecto com mais de 15 estações cortando a Bacia de dez em dez quilômetros, principalmente ali no Megalé, no Taquari, onde as atividades sísmicas são mais evidentes e atuantes”, destaca Edna.
A professora lembra que a região já teve um evento de magnitude 5,4, registrado em 1964, que foi o mais forte. “No Pantanal, a profundidade dos eventos é de cinco quilômetros, ou seja, seu hipocentro ocorre próximo à superfície, bem abaixo do sedimento da bacia, no embasamento do cristalino e a magnitude fica em torno de cinco”, acrescenta. “Até o momento não podemos prever um evento sísmico, mas as estatísticas levantadas nos mostram que a cada cinco anos, aproximadamente, eles acontecem com maior intensidade. O sismo de Coxim de 2009, por exemplo, foi segundo mais forte, de magnitude 4,8 e provocou queda de telhados, moveis tremeram, objetos caíram. Em Miranda, em 2015, a magnitude foi de 4,0”, exemplifica a coordenadora. “Na superfície, em termos de relevo, não conseguimos ver alterações. Em 2009, por exemplo, verificamos estragos nas edificações, principalmente, as que são construídas sem um alicerce bem feito”, completa. “Sismos entre um e três na Bacia do Pantanal são muito frequentes. Em 2015, por exemplo, conseguimos registrar mais de 200. Como é um local com densidade de população muito baixa, é pouco difundido”, salienta Edna.
Sobre o funcionamento das estações, Jackson explica que, basicamente, são compostas por um sensor banda larga que capta movimentações do solo da ordem de nanômetros, um digitalizador que recebe os registros do sensor, digitaliza, armazena e prepara os dados para transmissão. “Normalmente ficam distantes de grandes cidades para evitar o ruído. Essas estações são tão sensíveis que são capazes de detectar animais pequenos andando próximos ao sensor ou até mesmo um sismo de magnitude maior que 6 em qualquer lugar do mundo”, comenta. “Distribuímos dados sismológicos para pesquisadores e instituições de pesquisa em todo mundo, atualmente mais de 30 centros de pesquisas em países como Japão, Ucrânia, Alemanha, França, EUA, Colômbia, Peru, Paraguai, Argentina, Bolívia, Uruguai e Chile estão recebendo dados em tempo real da RSBR”, fala.
Resultados
“Em setembro vamos apresentar dados do projeto em um congresso internacional em Quito, no Equador. Os estudos já resultaram também em artigos publicados em revistas nacionais e internacionais”, relata a professora Edna. Entre os trabalhos, está o artigo publicado no Jornal Brasileiro de Geofísica.
O projeto envolve uma variedade grande de pesquisadores de outras instituições. “Para o monitoramento da bacia do Pantanal, temos parceria com a UFMS, UFMT, Universidade Nacional de Asunción (Paraguai), Observatório de San Calixto, da Bolívia, e com a Academia Chinesa de Ciências Geológicas, que nos emprestou 20 estações para o projeto. Além disso, temos alguns convênios para fornecimento de espaço para instalação das estações sismográficas com o Sesc Pantanal, Instituto Homem Pantaneiro, Projeto Panthera e Exército Brasileiro”, completa Jackson.
“A colaboração da UFMS nesse projeto na bacia do Pantanal e na RSBR tem sido fundamental em toda a questão logística e apoio para o processamento dos dados do MS. Além disso, nesses quase 20 anos de parceria houve bastante interação científica entre os grupos. Edna é uma grande parceira e entusiasta da sismologia no Brasil, espero que a gente consiga manter e ampliar essa colaboração com a Universidade por mais tempo”, finaliza Calhau.
Texto: Vanessa Amin
Fotos/Imagens: acervo dos pesquisadores
Tags: UFMS
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