Um dos advogados do executivo brasileiro Carlos Ghosn, ex-presidente da aliança entre as montadoras Nissan e Renault, disse neste sábado (4) que se sentiu zangado e traído pela fuga do empresário do Japão, mas demonstrou compreensão pela decisão e pelo medo de não ter um julgamento justo no país.
“Meu cliente Carlos Ghosn deixou o Japão em 29 de dezembro de 2019, ignorando as condições de sua libertação sob fiança”, começa o texto publicado hoje no blog pessoal de Takashi Takano, um dos advogados japoneses do executivo, que aguardava o início do julgamento por causa das irregularidades financeiras das quais é acusado.
Quando Takano soube, na manhã do Ano Novo, que Ghosn havia fugido para o Líbano, sentiu pela primeira vez o que descreveu como “raiva intensa”, como diz em um texto que inclui várias conversas com Ghosn, que nasceu no Brasil de uma família de origem libanesa e que também tem nacionalidade francesa.
“Eu me senti traído. Mas quando me lembrei de como fui tratado pelo sistema judicial deste país, a raiva seguiu uma direção diferente”, escreveu. “Eu certamente fui traído. No entanto, não foi Carlos Ghosn quem o fez”, completou.
No texto, o advogado descreve as estritas condições de fiança a que Ghosn estava sujeito e reproduz supostas conversas com o empresário, nas quais seu cliente expressa seu medo de não ser julgado de maneira justa pela justiça japonesa.
“Infelizmente, os réus criminosos não podem esperar um julgamento justo neste país. O juiz não é um poder independente. Ele é parte de uma burocracia. A mídia japonesa é apenas uma agência de relações públicas do Ministério Público. No entanto, muitos japoneses não estão cientes disso”, denunciou.
Ghosn, 65 anos, saiu de casa sozinho no último domingo, segundo imagens das câmeras de vigilância, e reapareceu apenas na terça-feira, em Beirute, onde afirmou estar escapando de injustiças e de uma perseguição política.
Segundo o texto publicado hoje por Takano, o brasileiro questionou o sistema japonês várias vezes desde que foi preso, no final de 2018, e perguntou repetidamente se poderia esperar um julgamento justo.
“Suas perguntas e ansiedade pareciam ter crescido à medida que o processo avançava”, escreveu o advogado. “Ele se sentiu desesperado, entre outras coisas, sobre as condições da fiança, que claramente violaram a Lei Internacional dos Direitos Humanos”, completou Takano, que admitiu que a frequência dos questionamentos de Ghosn “diminuiu gradualmente”.
A última vez que os japoneses viram o homem de negócios foi na véspera de Natal, quando ele e a esposa, Carole, conversaram por vídeo. O executivo teria fugido dentro de uma caixa de equipamentos de som, segundo o jornal americano “Wall Street Journal”, em uma operação que, na opinião do advogado, não seria possível para a maioria dos réus no Japão.
“Se (os réus) tivessem os recursos e financeiros e as conexões dele (Ghosn), poderiam ao menos pensar em tentar”, comentou Takano, que lamentou o que vê como desfecho do caso. “É uma conclusão solitária e decepcionante. Deveria haver uma conclusão diferente”, encerrou. EFE
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