Nesta terça-feira (26), o juiz Vitor Dias Zampieri presidiu uma sessão de julgamento do Tribunal do Júri em Dourados, envolvendo feminicídio. O caso emblemático gerou grande comoção social na população douradense. Ao final da sessão, o conselho de sentença julgou o réu culpado e o juiz condenou-o a 27 anos, 9 meses e 10 dias por feminicídio de reclusão, em regime inicial fechado.
O réu foi condenado também a um ano de detenção e 10 dias-multa por posse irregular de arma de fogo e essa mesma pena foi aplicada ao cunhado do réu, A.M.S., que confessou ter guardado a arma do agressor em sua residência.
De acordo com a sentença condenatória, o réu foi ainda condenado a pagar um valor mínimo de reparação de danos aos filhos, considerando que a fixação de indenização mínima é efeito automático da condenação, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, no valor de 100 salários mínimos atuais, que corresponde a R$ 99.800,00.
O juiz determinou na sentença a intimação do Estado para que o réu-agressor ressarça os valores gastos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no atendimento da vítima, como previsto na Lei nº 13.871/2019, além de determinar que o promotor da Infância e Juventude da comarca de Dourados seja oficiado para apurar se é caso de perda de poder familiar do réu em relação aos filhos, como consequência de uma inovação legislativa, nos termos do art. 23, § 2º, do ECA e art. 1.638, parágrafo único, I, a, do Código Civil.
Entenda – De acordo com a denúncia, E.A.O.R. manteve um relacionamento conjugal por 15 anos com a vítima e da união nasceram quatro filhos. No dia 25 de junho de 2018, por volta das 15 horas, no Parque das Nações I, em Dourados, por motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima, além da condição de sexo feminino, o réu atirou na cabeça da mulher.
Consta do processo que o relacionamento do casal era conturbado, com agressões físicas e emocionais praticadas pelo réu contra a vítima. O marido era muito possessivo e, um mês antes do crime, o casal desentendeu-se porque ele descobriu que companheira comunicava-se com um colega de trabalho por mensagens telefônicas.
Na ocasião, o réu agrediu a vítima com um cabo de vassoura, resultando em lesões corporais, além de ameaças e xingamentos. O marido então asseverou que compraria uma arma para matar o colega de trabalho da vítima. A mulher registrou um boletim de ocorrência e solicitou medida protetiva, em razão do grande temor que sentia do agressor.
A partir de então, a vítima passou a morar com a mãe, enquanto o agressor estava proibido judicialmente de se aproximar ou manter contato com a vítima. Ainda assim, o réu comprou a arma, guardou-a na residência do cunhado e permanecia nos arredores da casa, esperando o momento em que a ex-mulher saísse do local para reatar o relacionamento. Além disso, ordenou aos filhos que, ao visitarem a mãe, pegassem seu celular para que monitorasse os contatos mantidos pela vítima.
No dia do crime, a vítima e o filho de 14 anos levavam a motocicleta da mulher até uma oficina mecânica, quando foram abordados pelo réu, que chegara de moto querendo que ela desbloqueasse o celular para que pudesse visualizar as mensagens. Ante a recusa dela, ele mostrou a arma na cintura e iniciou uma discussão com a vítima, interrompida pelo filho.
Com o fim da discussão, a vítima e o adolescente foram até a oficina para deixar o veículo, sempre seguidos pelo acusado. Antes de chegar ao local, foram abordados novamente pelo réu que puxou a mulher pelo braço e a levou para um canto afastado da rua, com pouca movimentação.
Ato contínuo, o réu desferiu diversos socos no rosto da mulher, tendo ela caído ao chão. O filho jogou um pedaço de madeira contra o pai, na tentativa de impedi-lo, entretanto, não acertou. O agressor tirou a arma de fogo da cintura, mirou na cabeça da vítima e disparou diretamente contra o crânio da ex-companheira.
E.A.O.R. foi pronunciado por homicídio qualificado, por motivo torpe, com recurso que dificultou a defesa e feminicídio, além de posse irregular de arma de fogo. No decorrer do processo, a defesa requereu exame de sanidade mental no réu, sugerindo que o crime pudesse ter sido motivado por influência de “forte paixão”. O pedido foi negado pelo juiz, em recurso ao TJMS e em novo recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Por envolver feminicídio, o processo tramitou em segredo de justiça.
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